ST 8 - Trabalhadores, Proprietários e Estado no Contexto da Ditadura Civil-Militar (1964-1985)
Coordenação: Doutorando Arthur Victor Barros (UFPE) e Doutorando Ademir Bezerra de Melo Júnior (UFPE)
O golpe civil-militar de 1964 instalou no Brasil um regime ditatorial que durou 21 anos. Se consideramos que esse evento se desenvolveu num contexto em que a classe trabalhadora, na cidade e no campo, gozava de relativo protagonismo no debate sócio-político, não resta dúvida que o golpe pode ser entendido também como uma reação da classe dominante. Um fenômeno que assegurou os interesses dos proprietários e a manutenção das relações de exploração, através da adoção de medidas que abarcaram inclusive o aperfeiçoando da burocracia estatal. Nesse sentido, a proposta do presente simpósio procura constituir um amplo espaço para a discussão dos diversos aspectos relacionados às mobilizações dos trabalhadores durante os anos de repressão: nas fábricas ou no meio rural, seja através de greves, associações, movimentos reivindicatórios, sindicatos e também por meio dos órgãos do estado, com a interferência e mediação direta da burocracia estatal nas relações trabalhistas, como é o caso da Justiça do Trabalho. As análises contemplam também trabalhos que têm por objeto as relações de exploração impostas pela classe dominante, que muitas vezes se confundem com a formulação e promoção de políticas de Estado, seja através de organismos privados ou a partir das iniciativas governamentais permeadas pela própria burocracia estatal. Essa mesma classe que naqueles anos contaram inclusive com os órgãos ligados aos aparelhos investigativos e de repressão vinculados às noções de crime político, atuantes ostensivamente na perseguição e criminalização das atividades reivindicatórias dos trabalhadores brasileiros, práticas inseparáveis desse momento da história nacional.
BIBLIOGRAFIA
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Sessão 1 - Dia 21 de outubro de 2020, 14 horas
O planejamento econômico e migração no contexto do Estado Militarizado (1970-1980).
Rodolfo Belchior Fernandes de Paula
O debate sobre migrações está diretamente ligado à questão territorial, afinal está em jogo a localização espacial de seres humanos, aqui buscamos apresentar um debate historiográfico sobre a questão das migrações internas e políticas migratórias no Brasil concernente à gestão do território, no contexto do Estado Militarizado. Logo, devemos compreender que a migração, mais que um fenômeno espontâneo é fruto da interferência direta do Estado, sobretudo no caso brasileiro. Apesar de ser um direito, ir e vir torna-se, para o trabalhador rural brasileiro, em seu habitus itinerante, uma decisão forçada, daí falar em migração dirigida. Tal direcionamento é fruto, nos anos dos governos militares, da ação de um Estado Planejador que entende o território em sua totalidade, e edita planos, programas, ações estratégicas a fim de garantir o controle tanto do espaço quanto das pessoas que lhes são subordinadas. Agravando assim, o acesso à terra de modo isonômico, e direcionando a mão de obra para atender à demanda estipulada pelo capitalismo.
Palavras-chave: Migração; planejamento; Estado Militarizado.
Trabalhadoras rurais: uma discussão sobre a assistência à saúde no cerne da Ditadura Militar.
Marina Franco Santa Rosa
Resumo: A pesquisa aqui apresentada dá ênfase à fundação e atuação do Hospital referido Adelaido Ribeiro de Riachão do Jacuípe, mais precisamente as pessoas que compunham a Liga Jacuipense de Proteção à Maternidade e à Infância (LJPMI), e aos atendimentos realizados, tecendo uma análise do perfil das pessoas que se beneficiaram no processo. O intuito é problematizar a ausência das mulheres nos espaços de poder, e mais precisamente verificar o lugar social que as mesmas ocupavam no cerne da Ditadura Militar brasileira. Porém, elucidando a diferenciação e privilégios entre gênero e raça. Para tal, dialogo com feministas negras e elucido em linhas gerais os limites das discussões e produções feministas que ignoram a opressão e silenciamento das questões que tangem aspectos das mulheres negras em esferas políticas, econômicas e sociais, trazendo a discussão para um campo micro, de exclusão de mulheres no hospital em questão.
Palavras-chave: Assistência a saúde; Espaços de poder; Mulheres.
Trabalhadores rurais e o “credo vermelho”: experiências protestantes na Liga Camponesa em Goiana, Pernambuco
Arthur Victor Barros; Márcio Ananias Ferreira Vilela
Entre os anos finais da década de 1950 e início dos anos 1960, os trabalhadores rurais foram protagonistas de um tempo de grande convulsão social. Atuando nas Ligas Camponesas ou nos sindicatos rurais, os trabalhadores mobilizaram lutas que tinham como finalidade a conquista de direitos, alcançando melhores condições de vida e trabalho. Essas experiências foram registradas cuidadosamente pelas autoridades policiais do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), que enxergavam nas mobilizações o desenvolvimento da ameaça comunista em Pernambuco. Dos registros policiais foi possível identificar a mobilização dos trabalhadores em Goiana, município da Zona da Mata Norte de Pernambuco. A partir da denúncia de incêndios nos canaviais das usinas pertencentes à Companhia Açucareira de Goiana, os investigadores policiais descreviam em seus relatórios a presença de “elementos perigosos” que contribuía para a “desestabilização da ordem” naquele município. Ao mesmo tempo, a análise dos registros policiais trouxe à luz a participação de protestantes nessas mobilizações sociais que, segundo a interpretação dos investigadores, promoviam uma nova modalidade de “infiltração comunista no campo”. Portanto, nosso objetivo repousa sobre a investigação da participação protestante nas mobilizações rurais em Goiana, enfatizando o papel dessas lideranças e sua aproximação com o debate sobre o Evangelho Social.
Palavras-chave: Protestantismo; Ligas camponesas; Goiana.
Espaços de Resistência: a luta das trabalhadoras e trabalhadores rurais nos processos trabalhistas na plantation açucareira da Paraíba 1964-1985.
Rivaldo Amador de Sousa
No Brasil, a exploração e a violência no campo tem sido as principais formas de dominação das elites agrárias com a colaboração de órgãos do próprio Estado. Durante o regime ditatorial (1964-1985) as lutas por direitos sociais e políticos se configuravam uma espécie de crime, na medida em que os personagens dessas lutas passavam a ser considerados subversivos. No entanto, e apesar de todas as formas de repressão às essas lutas, muitos se lançaram na construção de campos de resistência. No mundo rural as formas de exploração e violência praticadas por senhores de engenho e usineiros foram diversas, se constituindo como modos de dominação em que o próprio Estado se negava a percebê-las. Apesar de toda pressão imposta à gente campesina, muitos trabalhadores rurais, colocando as suas próprias vidas em risco, enfrentaram a ira de senhores de terra. As formas de resistência organizada, por meio de sindicatos rurais, foram os principais meios encontrados pelos trabalhadores rurais para enfrentar melhor os desrespeitos aos seus direitos trabalhistas e às suas próprias vidas. Dessa maneira, foram, paulatinamente, construindo uma cultura do direito no campo, principalmente no que concerne a aplicação da legislação trabalhista. Em parte dessas organizações se intensificou a luta por salário digno, carteira assinada, férias remuneradas, hora extra, acesso à terra, sítio etc. Nas áreas canavieiras da Paraíba muitos trabalhadores do campo, moradores de engenho recorreram à justiça do trabalho para conquistar parte de seus direitos trabalhistas negados pelos senhores de terra. A proposta dessa comunicação é discutir como os processos trabalhistas revelam em suas páginas preservadas essa luta dos trabalhadores, e como podemos perceber a construção de uma cultura do direito no mundo campesino.
Palavras-chave: Luta Política. Processos Trabalhistas. Dominação. Resistência.
“Colocar questão e cobrar os direitos”. As disputas dos trabalhadores e trabalhadoras rurais da Zona da Mata de Pernambuco na Justiça do Trabalho.
Marcela Heráclio Bezerra
Ir à Justiça do Trabalho para reivindicar direitos foi um caminho trilhado por muitos trabalhadores e trabalhadoras da Zona da Mata Sul de Pernambuco. Embora em número reduzido, em relação ao universo de pessoas que trabalhavam no setor sucroalcooleiro, as ações trabalhistas impetradas por esses trabalhadores, na 1ª Junta de Conciliação e Julgamento do Cabo de Santo Agostinho, evidenciaram a determinação que tinham para lutar pelos seus direitos. E assim, constituindo-se como mais um espaço de cobrança e negociação, mediado pelo Estado, os trabalhadores reclamavam a seus empregadores, baseados na Convenção Coletiva de 1979 e na Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT: pagamento das tarefas a partir da forma que era realizado e do quantitativo produzida; normas de segurança para o deslocamento dos trabalhadores; cumprimento da licença maternidade e o pagamento do salário família; descanso semanal remunerado, horas extras, entre outros. O objetivo dessa apresentação é analisar os processos trabalhistas impetrados pelos trabalhadores e trabalhadoras rurais, na 1ª Junta de Conciliação e Julgamento do Cabo de Santo Agostinho, no ano de 1980, à luz da CLT e da Convenção Coletiva de 1979, assinada entre os trabalhadores rurais e os empregadores do setor sucroalcooleiro. Em termos metodológicos, utilizou-se a análise de fontes documentais e a história serial. Também, o entrecruzamento de fontes manuscritas, impressas e orais, sobretudo a documentação oriunda da Justiça do Trabalho, do movimento sindical e as entrevistas realizadas com trabalhadores e trabalhadoras rurais. A greve de 1979, organizada pelos Sindicatos de Trabalhadores Rurais de São Lourenço da Mata e Paudalho, foi o marco da retomada dos espaços de luta política e negociação dos trabalhadores rurais da Zona da Mata de Pernambuco. A Convenção de 1979, assinada pelos representantes dos trabalhadores e dos empregadores, aprovou a Tabela de Tarefas, instrumento que permitia aos trabalhadores saber previamente quanto iriam receber por cada tarefa realizada (à semelhança da 1ª Tabela de Tarefas, aprovadas no Acordo do Campo, em 1963, no governo de Miguel Arraes). A Convenção de 1979 e a CLT foram os principais instrumentos jurídicos que regulamentavam as relações de trabalho mencionados nas ações trabalhistas analisadas. Enquanto a Convenção estabelecia a remuneração e as condições de trabalho, a CLT garantia o direito à 13ª, férias, salário maternidade, aviso prévio, descanso semanal. Nesses processos, constatou-se a participação ativa dos sindicatos dos trabalhadores, através dos advogados que auxiliavam e representavam os reclamantes. Ademais, as testemunhas arroladas pelos trabalhadores, outros trabalhadores, foram fundamentais para a instrução e julgamento dos processos, sobretudo na ausência de prova documental (recibos de pagamento, folhas de ponto, anotação na carteira de trabalho). Entre o cumprimento do contrato de trabalho e a realização da justiça social, os desfechos das ações foram variados: processos conciliados (a maioria), julgados procedentes, procedentes em parte, improcedentes e arquivados (por não comparecimento do reclamante, por desistência). Sem ter a pretensão de esgotar a discussão, pois as interpretações sobre os papéis desempenhados pela Justiça do Trabalho são múltiplas, compreende-se que a Justiça do Trabalho garantiu aos trabalhadores rurais espaços de reafirmação e alargamento de direitos.
Palavras-chave: Trabalhadores e trabalhadoras rurais; Convenção Coletiva; CLT; Direitos trabalhistas Justiça do Trabalho.